Produção em alta, consumo em baixa: o risco de estoque encalhado no PIM
André Ricardo Costa
Doutor em Administração pela USP e professor da Ufam
Na esteira de quase 48 meses de acréscimos ininterruptos no emprego e renda da população brasileira, as empresas do PIM mostram sucessivos aumentos na produção, faturamento, empregos e investimentos. Até julho de 2025 os investimentos, em volume de US$ 9,5 bilhões, já se aproximam de todo o realizado em 2024. O faturamento é quase 12% maior.
Contudo, há sinais que a produção tem excedido a capacidade de absorção do mercado consumidor. No relatório ANA há os números do primeiro semestre de 2025. Confrontar a quantidade produzida com a quantidade vendida permite estimar eventual excesso ou lacuna de produção. O preço médio, obtido a partir do faturamento, permite expressar a diferença em termos monetários. Olhando apenas para os produtos divulgados pela Suframa, os principais ante os quase 2 mil cadastrados, o ANA percebera o valor de R$ 2,5 bilhões em excesso de produção, periclitante se comparar com os R$ 40 milhões do primeiro semestre de 2024.
Para julho a Suframa trouxe números que agravam a preocupação. O conjunto dos 26 produtos divulgados mostram um excesso de produção no valor de R$ 2,78 bilhões. Até junho o problema era concentrado em televisores e nos itens de ar-condicionado. Motocicletas mostravam o cenário ideal de produção nas máximas para atender à demanda aquecida. Celulares mostravam acomodação da produção devido ao muito tempo sendo um dos poucos produtos do PIM com persistente baixa demanda.
Agora, até motocicletas entraram no campo do excesso de produção. No acumulado até junho eram 1,071 milhão em quantidade produzida, e quase 1,074 em quantidade vendida. As vendas recorriam ao estoque de 2024. Em julho a produção acrescentou 154,7 mil unidades ao estoque, mas somente 148 mil foram vendidas. Nesse nível mensal de 150 mil, não será difícil vender o excesso de 6 mil motocicletas já a curto prazo. Trata-se do nosso produto mais valioso, preço médio de R$ 16,9 mil, e qualquer descasamento entre produção e vendas traz forte impacto. Em julho foi de R$ 112 milhões, sendo a maior explicação para o aumento de R$ 252 milhões no excesso total.
O que preocupa, na verdade, é a disseminação dos outros R$ 140 milhões que perfazem a piora. Excesso de monitores estava em R$ 215 milhões, em julho piorou para R$ 266 milhões. Bicicletas, de R$ 280 para R$ 302. Os quatro itens de ar-condicionado (conjunto split, condensador, evaporador e janela) pioraram em R$ 27,5 milhões. Neste cenário os celulares são a exceção, pois até junho registrava lacuna de R$ 282 milhões, vendas excedendo produção, fazendo recorrer ao estoque antigo. Em julho a produção aumentou em 15%, diminuindo a lacuna para R$ 216 milhões, mostrando que tem muito espaço para crescer.
Esses números mostram provável acomodação no mercado consumidor brasileiro, cujo ápice no começo do ano pode ter levado líderes de algumas empresas do PIM a decisões equivocadas. Parecido com o que ocorreu no período 2012 a 2015, mas em tamanho e ritmo bem mais suaves. O cenário atual é menos catastrófico quanto à trajetória da relação dívida/PIB da União Federal, mesmo para juros e inflação. Fora que 2025 ainda terá Black Friday e Natal. Em 2026, eleição e Copa do Mundo. O ajuste deve vir em 2027. Que estejamos preparados.