Um chamado contra a miopia gerencial
André Ricardo Costa
Doutor em Administração e Professor da Ufam
Conforme um postulado de Finanças, todo projeto com valor presente líquido positivo merece engajamento e encontrará as devidas fontes de financiamento. Grandes investidores e executivos costumam expressar esse postulado com maior elegância. Por exemplo Abílio Diniz, que acaba de nos deixar, “...nunca deixo de olhar as oportunidades (...) são como um trem que passa na porta da tua casa e você não sabe se vai passar no dia seguinte”. Conhecer bem esse postulado é fundamental para entender o estágio de desenvolvimento de um país ou região como um conjunto de oportunidades usufruídas ou desperdiçadas.
Sendo verdadeiro o postulado, as empresas têm sucesso ou quebram na medida em que seus gestores veem boas oportunidades e as tratam como tal, com total engajamento e delas usufruindo ao máximo, e rejeitam as “barcas furadas”, que são os projetos tendentes a consumir muitos recursos para oferecer retornos proporcionalmente baixos. Constantemente as empresas são premiadas pela sociedade por aumentos patrimoniais quando sabem lidar com as oportunidades.
Mas as empresas insistem em quebrar. Será que a Ciência das Finanças tem falhado em seu objetivo em levar as empresas a cumprirem seu papel social no gerar valor aos investidores? Certamente não. Da mesma forma que a Medicina não descobriu a cura para todas as doenças, as Finanças sempre vão lidar com as imperfeições de mercado, ajustando-as conforme a dedicação e liberdade dos pesquisadores e profissionais.
Assim, o postulado fundamental de Finanças pode ser interpretado como uma forte tendência que tende a ser concretizada mesmo quando as condições de temperatura e pressão não são as ideais. E as condições são ajustadas nos esquemas de incentivos estabelecidos para que o gestor evite ao mínimo os projetos com valor presente líquido positivo, e ao máximo os com valor presente líquido negativo. Qualquer coisa diferente disso é expropriar recursos dos donos do patrimônio.
Os gestores costumam ser míopes quando são capturados por um investidor excessivamente majoritário. Também ocorre no outro extremo, quando são tentados ao simples relaxamento em contexto de estrutura de propriedade muito pulverizada, onde os proprietários são muitos pequenos investidores com reduzida capacidade de monitoramento. Naquele caso, o gestor não vê a vantagem de resistir ao assédio do majoritário. Neste, não enxerga motivos para agir com máxima diligência e criatividade em prol dos interesses dos que não lhe monitoram. Por vezes satisfazem interesses individuais contrários aos dos investidores, pois esse tipo de retorno é mais imediato, mais fácil de ver. No final das contas, nem todos e nem sempre os melhores projetos são escolhidos. E assim emergem os problemas de governança.
Em resposta, não há outro remédio. Os proprietários precisam tomar iniciativa de monitorar os gestores. O problema é que isso parte do quanto os proprietários têm noção do valor do próprio patrimônio, e das chances de expropriação por parte dos gestores.
Ao reconhecer que precisamos de projetos de país, ou de Amazônia, precisamos nos espantar com o tanto de oportunidades que estão ao nosso redor, e somos impedidos de usufruí-las. E do tanto de ativos que nos são consumidos, expropriados, e nem nos damos conta. Os que conduzem essas transações, ou impõem essas limitações, ganhariam muito mais se usassem seus instrumentos e habilidades em prol de toda a sociedade, por ganhos permanentes e de longo prazo. Mas esses retornos são muitos difíceis de enxergar. Estão muito distantes dos olhos dos míopes.